segunda-feira, 12 de abril de 2010

Poeta Antonio Francisco - O Novo Patativa



O homenageado de hoje do “A Arte Do Meu Povo”, se descobriu poeta só aos 46 anos, porém de lá pra cá, só vem surpreendendo a todos com uma poesia simples e magnífica , muitos até já o comparam com Patativa do Assaré. Poeta Antonio Francisco, um talento fenomenal para a nossa cultura popular.



O site http://recantodasletras.uol.com.br/audios/poesias/14062 trás a seguinte biografia :




“É filho de Francisco Petronilo de Melo e Pêdra Teixeira de Melo. Graduado em História pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Poeta popular, cordelista, xilógrafo e compositor, ainda confecciona placas. Aos 46 anos, muito tardiamente, começou sua carreira literária, já que era dedicado ao esporte, fazia muitas viagens de bicicleta pelo Nordeste e não tinha tempo para outras atividades. Muitos de seus poemas já são alvo de estudo de vários compositores do Rio Grande do Norte e de outros estados brasileiros, interessados na grande musicalidade que possuem. Em 15 de Maio de 2006, tomou posse na Academia Brasileira de Literatura de Cordel, na cadeira de número 15, cujo patrono é o saudoso poeta cearense Patativa do Assaré. A partir daí, já vem sendo chamado de o “novo Patativa do Assaré”, devido à cadeira que ocupa e à qualidade de seus versos.”





Eis algumas obras de arte em forma de poesia do Poeta Antonio Francisco...



AQUELA DOSE DE AMOR
Antônio Francisco


Um certo dia eu estava
Ao redor da minha aldeia
Atirando nas rolinhas
Caçando rastros na areia
Atrás de me divertir
Brincando com a vida alheia.

Eu andava mais na sombra
Devido ao sol muito quente
Quando vi uma juriti
Bebendo numa vertente
Atirei ela voou
Mas foi cair lá na frente.

Carreguei a espingarda
Saí olhando pro chão
Procurando a juriti
Nos troncos do algodão
Quando surgiu um velhinho
Com um taco de pão na mão

O velho disse: - Senhor
Não quero lhe ofender
Mas se está com tanta fome
E não tem o que comer
Mate a fome com este pão
Deixe este pássaro viver !

Eu disse: - Muito obrigado
Pode guardar o seu pão
Eu gasto mais do que isto
Com a minha munição
Eu mato só por prazer
Eu caço por diversão.

O velho disse: - É normal
Esse orgulho do senhor
E todo esse egoísmo
Que tem no interior
É porque falta em seu peito
Aquela dose de amor.

Se eu tivesse botado
Ela no seu coração
Você jamais mataria
um pardal sem precisão
nem dava um tiro num pato
apenas por diversão.

Eu fiquei muito confuso
com as frases do ancião
aquelas suas palavras
tocaram meu coração
derrubando o meu orgulho
e a vaidade no chão.

Vali-me da humildade
E disse perdão senhor
desculpe a minha arrogância
mas lhe peço por favor
que me conte esta historia
sobre essa dose de amor

O velho disse: - Pois não
Vou explicar ao senhor
Porque mesmo sem querer
Sou o maior causador
De hoje em dia o ser humano
Ser tão carente de amor.

Isso tudo aconteceu
há muitos séculos atrás
quando meu pai fez o mundo
terras, mares, vegetais
me pediu prá lhe ajudar
no último dos animais.

Pai me disse:-Filho eu fiz
da formiga ao pelicano
botei veneno na cobra
bico grande no tucano
agora estou terminando
este animal ser humano.

Mas ficou meio sem graça
este animal predador
o couro não deu prá nada
a carne não tem sabor
na cabeça tem juízo
Mas no peito pouco amor.

Por isto que eu lhe chamei
prá você lhe consertar
botar mais amor no peito
lhe ensinar a amar
e tirar desta cabeça
o desejo de matar.

Depois disse: - Filho vá
amanhã lá no quintal
na casa dos sentimentos
perto do pote do mal
traga uma dose de amor
e bote nesse animal.

De manhã eu fui buscar
aquela dose sozinho
mas na volta eu me entreti
brincando com um passarinho
perdi a dose de amor
numa curva do caminho.

Quando eu notei que perdi
voltei correndo prá trás
procurei por todo canto
mas cadê eu achar mais
aí eu fiz a loucura
que toda criança faz.

Voltei peguei outra dose
igualzinha a do amor
o vidro da mesma altura
o rótulo da mesma cor
cheguei em casa e botei
no peito do predador.

Mas logo no outro dia
meu pai sem querer deu fé
do animal ser humano
chutando um sapo com o pé
e no outro ele mangando
dos olhos do caboré.

Vendo aquilo pai chorou
ficou triste e passou mal
me chamou e disse: - Filho
o bicho não ta normal
o que foi que você botou
no peito desse animal ?

Quando eu contei a verdade
de tudo aquilo que eu fiz
pai disse tremendo a voz
eu sei que você não quis
mas você botou foi ódio
no peito desse infeliz !

Esse bicho inteligente
com esse ódio profundo
com pouco amor nesse peito
não vai parar um segundo
enquanto não destruir
a ultima célula do mundo.

Depois daquelas palavras
chorei como um santo chora
quando foi a meia noite
eu saí de porta afora
e nunca mais eu pisei
na casa que papai mora.

Daquele dia prá cá
é essa a minha pisada
procurando aquela dose
em todo canto de estrada
pois sem ela o ser humano
prá meu pai não vale nada.

Sem ela vocês humanos
não sabem dar sem pedir
viver sem hipocrisia
ficar por traz sem trair
nem distante do poder
nem discursar sem mentir.

Sem ela vocês trucidam
e batizam os crimes seus
na era medieval
queimaram bruxos e ateus
e perseguiram os hereges
usando o nome de Deus.

Sem ela foram prá África
e fizeram a escravidão
com grilhões do preconceito
escravizaram o irmão
Com a espada na cintura
e uma bíblia na mão.

O velho disse: - Perdoe
ter tomado o tempo seu
consertar vocês humanos
é um problema só meu
aí o velho sumiu
do jeito que apareceu.

E eu fiquei ali em pé
coçando o queixo com a mão
pensando se era verdade
as frases do ancião
ou se tudo aquilo era fruto
de minha imaginação.

E naquele mesmo instante
vi passando na estrada
a juriti que eu chumbei
com uma asa quebrada
mas não tive mais coragem
de atirar na coitada.

Joguei fora a espingarda
voltei olhando pro chão
procurando aquela dose
nos troncos do algodão
prá guarda-la com carinho
dentro do meu coração.

Se acaso algum de vocês
tiverem a felicidade
de encontrarem aquela dose
eu peço por caridade
Derramem todo o sabor
Daquela dose de amor
No peito da humanidade.





A casa em que a fome mora
(Trechos) Antônio Francisco



Vi num barraco de lona
Um fio de esperança
Nos olhos de uma criança,
De um pai abandonado,
Primo carnal do pecado,
Irmãos dos raios da lua,
Com as costas semi-nuas,
Tatuadas de caliça, pedindo um pão de justiça
Do outro lado da rua

...

Engoli três vezes nada
E perguntei o seu nome.
Respondeu-me: sou a fome
Que assola a humanidade,
Ataco vila e cidade,
Deixo o campo moribundo,
Eu não descanso um segundo,
Atrofiando e matando,
Me escondendo e zombando
Dos governantes do mundo.





" E Viva A Arte Do Meu Povo!"

Nenhum comentário:

Postar um comentário